domingo, 12 de abril de 2009

sessão desvelada

(obra de pablo picasso)


Santiago chega à sessão e quase sem me cumprimentar adentra ao consultório e tomba sobre o divã.

Estou desolado. Desde que Nora me abandonou a vida é monocromática. Tudo é amarelo.
Quando começamos a ficar juntos ela quis que pintasse a parede detrás da cama de amarelo. Eu não gostei, parecia que não era a cor que esperava ver todas as noites e todas as manhãs. Porém ela, tão caprichosa, insistente, conseguiu que essa parede fosse amarela.

-E tu, o que querias

-evidentemente, satisfazê-la. Quando comprei essa casa, não nos conhecíamos, e chamei um decorador para que fosse a casa perfeita, tudo bege, minimalista, poucos móveis, poucos quadros, muitos aparelhos eletrônicos, muito cd, dvd e alguma vela branca pelo piso. Foram 6 meses de idílio com minha casa. Até que conheci Nora. Ela entrou a primeira noite que a levei aí e disse: Que frio tudo. Nesta casa não vive ninguém?
Me pareceu insuportável, porém era tão linda que pensei que esse comentário fosse um acidente prematuro nessa relação e seguimos.

- Sim, seguimos, pode continuar

- A semana passada me deixou. Não quer me ver mais. Me disse que era por que eu não queria ter filhos e ela sim. E me deixou com a parede amarela e uma tristeza enorme.

- Porém tu tampouco querias a parede amarela e agora a tens, e isso te acompanhará na ausência dela.

- Se não tivesse a parede amarela estaria numa solidão imensurável.

- Quiçá se não tivesses te oposto a lhe dar o filho que ela queria, além de uma parede amarela, terias um filho dela.

- Me fez um nó na garganta ... touche!!

- Continuamos na próxima

Marcela Villavella


Um comentário:

barbi disse...

Marcelita!!!
adoro ler as ss no...veladasssss
e sempre que a forte interpretação dá leveza ao ar
me sinto tocada

e essa parede amarela
esse filho
esse lugar
me diz que a psicoanálise e a poesia sustentam a flor

gracias mi amor,
barbi