sexta-feira, 24 de abril de 2009

traduceiro

(os comedores de batata, de Van Gogh)
vagalumes do Brasil

Ficar despreocupado, esperar que um dia ou outro nos livremos da miséria, pura ilusão! Eu me daria por feliz em trabalhar por uma pensão não mais que suficiente, e por minha tranquilidade em meu ateliê toda minha vida. (...)(...) Se pintássemos polidamente como Bouguereau, as pessoas não teriam vergonha de se deixar pintar; mas creio que o fato de acharem que o que eu faço é "malfeito" , "que não é mais que quadros cheios de pintura", me fez perder muitos modelos. Então as honradas putas têm medo de se comprometer e de que zombem de seus retratos. E há com o que quase se desanimar, quando sentimos que poderíamos fazer tantas coisas se as pessoas tivessem um pouco mais de vontade. Não posso me resignar a dizer que "as uvas estão verdes", não me consolo por não ter mais modelos. Enfim, é preciso ter paciência e voltar a procurar outros...E se, quando jovens podemos acreditar que pelo trabalho assíduo podemos satisfazer nossas necessidades, isto atualmente torna-se cada vez mais duvidoso. Disse de novo a Gaugin, em minha última carta, que se pintássemos como Bouguereau poderíamos esperar ganhar alguma coisa, mas que o público jamais mudará, e só gosta de coisas suaves e polidas. Tendo um talento mais austero, não se deve contar com o produto do próprio trabalho; a maioria das pessoas inteligentes o suficiente para compreender e gostar dos quadros impressionistas são e continuarão a ser pobres demais para comprá-los. Será que G. e eu trabalharemos menos só por causa disto? Não - mas seremos obrigados a aceitar a pobreza e o isolamento social como coisas inerentes. E, para começar, instalemo-nos aonde a vida for mais barata. Tanto melhor se o sucesso vier, tanto melhor se algum dia pudermos viver mais folgadamente. O que me toca o coração na obra de Zola é esta figura de Bongrand-Jundt. É tão verdadeiro o que ele diz: "Acreditam, infelizes, que quando o artista conquistou seu talento e sua reputação, passou a estar ao abrigo? Pelo contrário, a partir de então fica-lhe proibido produzir algo que não seja totalmente bom. Sua própria reputação o obriga a cuidar tanto mais de seu trabalho, quanto as chances de venda se rarefazem. Ao menor sinal de fraqueza toda a malta invejosa lhe cai em cima e destrói exatamente essa reputação e essa fé, que um público inconstante e traiçoeiro momentaneamente teve nele". Mais forte que isso é o que diz Carlyle: "Conheceis aqueles vagalumes que no Brasil são tão luminosos, que à noite as damas os fincam com alfinetes em suas babeleiras; a glória é muito boa, mas, vede, ela é para o artista o que o alfinete é para esses insetos.
(do livro VAN GOGH - Cartas a Théo. L&PM, Porto Alegre, 1986, tradução de Pierre Ruprecht)

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