sábado, 27 de março de 2010

TOURO SENTADO O VISIONARIO -III-

Anoitece, agora, em nós,

e a branca espuma da raiva,

envolve tudo.



A vida se entretém nos olores.



Tudo procede,

desde mais além da colina,

também,

nosso final.



Envelheci sentado,

aconselhando meus jovens,

a deterem-se,

frente a qualquer maravilha da terra,

frente a qualquer besteira da natureza

contra os sentidos.

E no entanto,

me decido,

quero morrer de pé.

E se é necessario,

atado a meu cavalo.



Miguel Oscar Menassa


De "Canto a nosotros mismos también somos América", 1978

sexta-feira, 26 de março de 2010

TOURO SENTADO O VISIONARIO - II -

Pequena árvore da colina,

estoura no sinal.

Desde suas raízes,

fogos artificiais

se incendeiam

entre o aromático perfume.

Quero dizer

que nossa pequena águia do trono,

também,

morreu.

Doçura,

a doçura de seus labios,

seu voo etereo.

Sua franca risada,

quando se burlava da guerra.

Conhecer,

conhecia – morreu por isso - na propria colina,

o estouro sangrento,

da árvore do amor.



Miguel Oscar Menassa


De "Canto a nosotros mismos también somos América", 1978

quarta-feira, 24 de março de 2010

TOURO SENTADO O VISIONARIO - I -


Aqui,

touro sentado,

amante do silencio.

Mirou o sol,

é o entardecer,

e sei,

que tudo é efêmero.

Virão eras atômicas,

e arrancarão de raiz nosso reino,

do centro da terra.

O sol cairá,

como um fruto podre,

como um pássaro ferido,

em pleno voo.

Detrás das colinas

vejo para o homem,

sangue e lixo,

um silvo gelado e noturno.

Aqui,

sentado,

amante,

touro do silencio,

vejo para o homem,

detrás das colinas.

A morte.



Miguel Oscar Menassa


De "Canto a nosotros mismos también somos América", 1978

segunda-feira, 8 de março de 2010

HOMENAGEM À MULHER TRABALHADORA

NO DIA INTERNACIONAL DA MULHER

POEMA 35                                   

É um momento de criação infinita,
me disse, estou a ponto de morrer.

Enquanto isso gozava pouco ou mais ou menos
a vida com ela era um idilio de sonhos,
tínhamos grandes peleias, sobretudo,
no dia depois
de haver gozado com exagero.

À noite, que trepada! Santo Deus!
Na manhã seguinte, propriamente, o calvario.

Ao principio, sempre queria matá-la
até que um dia pude compreender
que era seu gozo o que a matava.
Cada vez que me causava dano
eu, em vingança, a fazia gozar.

O gozo me sobressalta, não posso evitar,
primeiro sofro porque sinto que vou morrer,
depois, quando me encontro relaxada e trauquila,
toda viva, sofro porque algum humano me salvou.
O odio mais profundo sinto
quando me dou conta que devo tudo a ele,
um dia, ele me disse:
vagina funcionará, e vagina funcionou.
Depois, na metade de uma trepada,
me disse com ternura: a mulher deve poder
dizer todas suas coisas, escrevê-las,
fazer de suas coisas a historia da mulher,
de nosso tempo, de nosso mundo.
Depois, me ensinou a amar o trabalho
e ontem à noite me disse: já és livre.
Já sabes escrever, amar e trabalhar
e isso é o que necessita uma mulher
para poder produzir sua propria liberdade.

Escrever para que seja possível a vida.
Amar para poder construir o mundo
no qual haveremos de viver, pensar
e trabalhar para que símbolo e carne
não possam se confundir nunca mais.

Me encanta, disse ela com indolencia, a vida
que me propões antes de me abandonar.
E não te perguntaste que, talvez,
prefiro escrever a historia de nosso amor
que foi longinquo e impossível
e com o amor seguir insistindo
ainda que nada se possa de todo ou bem,
e trabalhar só para poder te comprar.

A mim, para dizer a verdade, lhe disse,
não me importam muito os motivos
nem quem haverá de se beneficiar
com o que possas produzir.
Só quero que experimentes
essa virtude do homem
de poder, com suas mãos,
modificar o mundo.

E quanto à poesia e ao amor,
se fosses capaz de entender
a força do trabalho,
te daria plena liberdade.
Podes escrever melhor que eu, se o desejas,
e podes me amar tanto quanto queiras.
E se não és capaz de tanta liberdade
podes escrever pior que eu
e podes amar outros amores
ou condenar-te a viver com os enforcados
ou encerrar-te em teu quarto,
limpando os colares e os arinhos de ouro
e passando a blusinha azul e branca
que tua mãe usava antes de morrer.
Também podes, se queres,
romper todos meus beijos,
queimar todas as cartas,
fazer picadinhos dos bordados do tempo
e começar, sozinha, desde o começo,
tudo de novo.

MIGUEL OSCAR MENASSA
DO LIVRO: LA MUJER Y YO

http://www.menassa.com/
http://www.menassacandidatopremionobelliteratura2010.com/