quinta-feira, 16 de abril de 2009

psicoanálise & direito

Instrumental Psicoanalítico e Racionalidade Jurídica

Em que consiste o uso do instrumental psicoanalítico para intentar revelar a racionalidade subjacente ao discurso jurídico ocidental? Trata-se de Psicoanálise do Direito ou das Instituições?

Legendre em “O Amor ao Censor” afirma não serem psicoanalisáveis nem as instituições, nem os textos jurídicos. São inanalisáveis por definição, diz, visto as ficcões não serem dotadas de corpo e carecerem de palavra – são estruturas vazias as quais preenchemos com textos que parecem servir para fazê-las falar.

O Direito não é palavra de um sujeito, mas uma avalanche de textos com os quais se recheiam as instituições e se produz assim um particular efeito de ficção: parece que as instituições falam.

Esse efeito, que se poderia apelidar de “teatro de fantoches”, permite a caracterização do Direito como “Texto sem Sujeito”, como efeito estrutural, e a instituição como estrutura.

Ao construir a hipótese de que além do discurso manifesto, existe outro, o denominado discurso latente, Freud pusera a descoberto o trabalho do inconsciente.

Legendre, a partir dessa construção teórica, registra que em meio ao discurso ordinário da censura, sustentado pelos juristas e seus lugartenentes, Freud faz sua aparição, mostrando que algo se joga por conta de outra cena.

O discurso freudiano demonstra a vida pulsional não alcançar o real senão passando, necessariamente, por uma instância de censura e de julgamento onde se resumem nossas relações parentais: o supereu.

Para Legendre esse é o conceito mais importante à introdução da compreensão do mecanismo institucional por via analógica com os mecanismos do psiquismo individual.

Assim, para o Autor, o desvelamento da racionalidade jurídico-institucional ocidental exigiria a distinção de dois pares de registros:

a) o registro da clínica, a singularidade neurótica do caso – deformação ou exageração do conflito natural -, a lei personalíssima que rege as crenças através das quais se assegura o submetimento à própria instância de julgamento - o supereu; e

b) a censura que intenta manipular em renovada reiteração o desejo.;

As alíneas “a” e “b” remetem a uma lógica da submissão, perfilando-se assim a outro registro, o da dimensão social, mediante os mecanismos de submissão e captura, denominadas por Legendre como técnicas de fazer crer.

O estabelecimento da correspondência entre os dois planos, o do supereu da clínica e o do supereu da cultura (Kultur Überich) permitirá a constatação de que a censura para ser lícita e a única, deverá ser conferida a outros que tenham tomado o poder dos pais, que tenham tomado o direito de mirada sobre nós. Fala-se dos doutores cuja ciência “es de la ley” .

O segundo par de registros faz a leitura do lugar onde a leitura se faz. Assim, distingue-se:

c) a leitura do texto institucional do ocidente intentada desde a Psicoanálise para buscar colocar em evidência sua racionalidade; e

d) com os resultados assim obtidos, a releitura do próprio discurso psicoanalítico.

Em ambos os discursos está em jogo o deciframento da submissão e da censura recortadas no mito: as crenças de amor e o desejo.
por Eliane Marques

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