quinta-feira, 19 de abril de 2012

Homenagem aos nativos desta terra!

UM ÍNDIO
Caetano Veloso Um índio descerá de uma estrela colorida e brilhante/ De uma estrela que virá numa velocidade estonteante/ E pousará no coração do hemisfério sul, na América, num claro instante/ Depois de exterminada a última nação indígena/ E o espírito dos pássaros das fontes de água límpida/ Mais avançado que a mais avançada das mais avançadas das tecnologias/ Virá, impávido que nem Muhammed Ali, virá que eu vi/ Apaixonadamente como Peri, virá que eu vi/ Tranqüilo e infalível como Bruce Lee, virá que eu vi/ O axé do afoxé, filhos de Ghandi, virá/ Um índio preservado em pleno corpo físico/ Em todo sólido, todo gás e todo líquido/ Em átomos, palavras, alma, cor, em gesto e cheiro/ Em sombra, em luz, em som magnífico/ Num ponto equidistante entre o Atlântico e o Pacífico/ Do objeto, sim, resplandecente descerá o índio/ E as coisas que eu sei que ele dirá, fará, não sei dizer/ Assim, de um modo explícito/ (Refrão) E aquilo que nesse momento se revelará aos povos/ Surpreenderá a todos, não por ser exótico/ Mas pelo fato de poder ter sempre estado oculto/ Quando terá sido o óbvio

sábado, 7 de abril de 2012

LENDO OS GRANDES POETAS

GATO NUM APARTAMENTO VAZIO



Morrer - isso não se faz a um gato.
Pois o que há de fazer um gato
num apartamento vazio.
Trepar pelas paredes.
Esfregar-se nos móveis.
Nada aqui parece mudado
e no entanto algo mudou.
Nada parece mexido
e no entanto está diferente.
E à noite a lâmpada já não se acende.

Ouvem-se passos na escada
Mas não são aqueles.
A mão que põe o peixe no pratinho
também não é a mesma.

Algo aqui não começa
na hora costumeira.
Algo não acontece como deve.
Alguém esteve aqui e esteve,
e de repente desapareceu
e teima em não aparecer.

Cada armário foi vasculhado.
As prateleiras percorridas.
Explorações sob o tapete nada mostraram.
Até uma regra foi quebrada
e os papéis remexidos.
Que mais se pode fazer.
Dormir e esperar.


Espera só ele voltar,
espera ele aparecer.
Vai aprender
que isso não se faz a um gato.
Para junto dele
como quem não quer nada
devagarinho,
sobre patas muito ofendidas.
E nada de pular miar no princípio.

WISLAWA SZYMBORSKA (1923, Bnin, Polônia- 1º/fev/2012, Cracócia, Polônia)

do Livro: Poemas (tradução: regina Przybycien)