sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

NOVELLA ZERO


Sessão de Psicoanálise (2)
(de Marcela Villavella)



9h45
Campainha

- Olá, cheguei em cima da hora... pensei que chegaria tarde, fui ao Tribunal às 7, tinha uma audiência às 8... pensei que não chegaria... mas …, bem, a juíza esteve no horário, meu cliente também... um divórcio muito doloroso... vinte anos casados... se atiram todo o tipo de culpa, tantos anos de vida juntos, e agora ela perdeu a paciência... apenas me ocorre isso, porque na audiência, ela estava tranquila, e ele destroçado. Meu cliente é ele... chora como um coitado, te parte a alma... sabe, a vida do tipo girava toda em torno dessa mulher, ela era sua pátria, sua bandeira, que sei eu...ele quer deixar tudo para ela, eu lhe digo que não exagere, que ele tem que seguir vivendo, e que ela já tem o bastante... não chego a me dar conta da causa que lhes separou...
- E por que queria saber a causa?
- Boa pergunta... parece que me angustia esse cliente... me faz recordar de meu velho, quando morreu minha velha... ficou sem vida durante muito tempo, até que depois ele morreu... me recordo que chorava enquanto fazia o churrasco aos domingos, não deixou de fazer nada do que fazia, porém tudo com lágrimas, o pranto aberto... me partia a alma... sim... quando morreu minha velha, me partiu a alma... morreu de repente, não pensei que iria morrer.... era eterna... quando era pequeno, tinha horror de que ela morresse, tanto medo tinha que olhava meu velho enquanto jantávamos e pensava... oxalá morra ele e ela não morra nunca....................................
- pode continuar, estou aqui viva, sigo te escutando.
- Fazia anos que não me recordava de minha velha, é verdade, como se também não estivesse morta... porque está sempre... quando meu velho chorava pela morte dela, eu o olhava com um pouco de desprezo, me parecia que exagerava...
- Ou melhor, o desprezo é porque ele seguiu vivo, e ela morreu primeiro... as coisas não se deram como tu havias planejado.
- Quiçá... não sei... muitas vezes sinto desprezo por gente...
- por mim???
- não, não, não dizia isso... como teria desprezo por você... não, ... pelos vizinhos, por alguns pais dos companheiros de meu filho.... por meu sogro....
- pelos pais, por teu sogro... também és um pai...
- não me vá dizer agora que é edípico e tudo isso que dizem os psicanalistas... gosto de me analisar com você por que nunca diz essas coisas... não me faça isso Ana, por favor...
- te pareceu desprezível minha pontuação??
- sim, sim, a verdade é que sim... hoje não te esmeraste em nada.
- Continuamos na próxima
- já??????'
- sim.
- Ok.... que dia raro hoje não??'

(novela originalmente escrita em espanhol; tradução para o português de Eliane Marques)

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