segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

(óleo e têmpera sobre madeira, "Retrato da Jornalista Sylvia Von Harden, de Otto Dix, Centro Georges Pompidou, Paris)


O SONHO

de Barbara Corsetti
PARTE 2

Começavam a servir comida. Várias mesas e gente sentada comendo e rindo muito.
Não havia pratos, nem talheres.
As mãos comiam.
Revirei a volta da casa, buscando entender onde estava. Não sabia chegar ao quarto das minhas malas.
Das paredes dos corredores escorriam veludos vermelhos.
Caminhei entre as salas e bocas religiosas que falaaaavam muito alto.
Estavam muito felizes todos, por horas eram parentes.
Por que tínhamos vindo pra essa casa?
Voltei pro jardim e entrei numa roda que falava sobre como vender melhor um produto.
Quando me envolvi com aquele tema vi um homem saindo da sala que dava para o jardim.
Numa das mãos ele carregava 1 cabeça, erguida pro alto feito troféu. A cabeça era de alguém que há pouco estava ao meu lado, conversando.
O homem a segurava pelos cabelos e gritava alto o nome pelo qual fora conhecida em vida. Fiquei imobilizada.
Todos riram e bateram palmas alegres.
Logo outro homem, carregando outra cabeça recém cortada.
Todos aplaudiam muito e gritavam encantados.
Vi outras pessoas com sangue no rosto.
Andar pela casa. Ouvir as conversas. Não me sentia parte da festa.
Será que daqui a pouco me chamariam pra uma dessas ...
Decidi ficar entre outras mulheres. Quando sentei no vazio da cadeira vi minha mãe diante de mim.
Notei que eu estava com um lenço rosa escuro no pescoço.
Peguei-o na mão e o movimentei como minha mãe fazia no outro lado da sala:


espichando e rezando, espichando e rezando, espichando e rezando, espichando e rezando, espichando e rezando, espichando e rezando. espichando e rezando, espichando e rezando, espichando e rezando. espichando e rezando, espichando e rezando, espichando e rezando.


Escorriam em mim as lágrimas dela e eu não dizia nada. Continuei parada, espichando e rezando.
Uma pergunta de menina sentou-se diante de mim:

– A senhora arruma meu cabelo? Minha mãe prometeu meus olhos!

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