sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

ERA UMA VEZ...

CAIU NA REDE É JACARÉ

(de Eliane Marques)

Ela bateu na menina com toda a força dos seus muros de mulher malamada cujo marido vai ter com os amigos da cachaça enquanto ela lava e passa a roupa dos patrões e chora na igreja a batina do padre e sua profissão de asceta. Bateu e colocou o pé na garganta da pequena de tranças até quase lhe matar de sufocação. Então pediu ajuda a um vizinho (para terminar de matar, será?). Esse ameaçou chamar a polícia (também para terminar de matar, será?) Tudo se passou por que a guria fora devolver a trouxa de roupas e, em vez de receber o pagamento e ir logo para casa entregar o dinheiro à sobrevivência da família, resolveu jogar no bicho a escravidão da genitora.
Todavia, para a surpresa dessa, depois das surras de outono, deu na cabeça o bicho que a guria havia jogado. Mas a lagoa já estava seca e o jacaré de dentes quebrados não distinguia nenhum lírio no campo.
A surra manteve-se ardida e olorosa à arruda nas tranças da guria que, desejando acertar na educação de seus filhos, internou-os, desde cedo, numa das casas de correção precursoras da FEBEM: não queria que os negrinhos se tornassem jogadores de bicho. Felizmente ocorreu tudo conforme seus votos: um dos filhos se tornou traficante e amante da branca de neve; outro morreu bem bêbado depois de ser muito acarinhado pelos zeladores das crianças internadas; dois estão nos céus: um na igreja do reino de deus e outro no manicômio e seus reis psiquiatras. Para o bem de todos, nenhum jamais jogou no bicho.

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