quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

LENDO OS GRANDES POETAS

NORMA E PARAÍSO DOS NEGROS

Odeiam a sombra do pássaro
na preamar da branca face
e o conflito de luz e vento
no salão da neve fria.

Odeiam a flecha sem corpo,
o lenço exato da despedida,
a agulha que mantém pressão e rosa
no gramíneo rubor do sorriso.

Amam o azul deserto,
as vacilantes expressões bovinas,
a mentirosa lua dos polos,
a dança curva da água na margem.

Com a ciência do tronco e do rastro
enchem de nervos luminosos a argila
e patinam lúbricos por água e areias
degustando a amarga frescura de sua milenária saliva.

É pelo azul rangente,
azul sem verme ou rastro adormecido,
onde os ovos de avestruz ficam eternos
e deambulam intactas as chuvas bailarinas.

É pelo azul sem história,
azul de uma noite sem temor de dia,
azul onde a nudez do vento vai quebrando
os camelos sonâmbulos das nuvens vazias.

É ali onde sonham os torsos sob a gula da erva.
Ali os corais empapam o desespero da tinta,
os dormentes apagam seus perfis sob a madeixa dos caracóis
e fica o oco de dança sobre as últimas cinzas.

Federico García Lorca (Granada, 05/06/1898 - Granada, 17 ou 18/08/1936)
do livro Poeta em Nova Iorque.

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